Comecemos por dois filósofos que
vieram no século XIX, mas cuja influência foi marcante no pensamento do século
XX: Kierkegaard e Nietzsche.
Sõren Kierkegaard (1813-1885),
pensador dinamarquês e precursor do existencialismo contemporâneo, é crítico
severo da filosofia moderna, de Descartes e Hegel. Afirma que nela o ser humano
não aparece como ser existente, mas como abstração, reduzido ao conhecimento
objetivo, quando, na verdade, a existência subjetiva, pela qual o indivíduo
toma consciência de si, é irredutível ao pensamento racional, e por isso, mesmo
possui valor filosófico fundamental.
Para Kierkegaard, a existência é
permeada de contradições que a razão é incapaz de solucionar. Ao criticar o
sistema hegeliano, diz que a dialética não encontra o móvel do seu dinamismo no
conceito, mas na paixão, sem a qual o espírito não receberia o impulso para o
salto qualitativo entendido como decisão, ou seja, como ato de liberdade. Essa consistência
das paixões leva o filósofo – também teólogo e pastor evangélico luterano – a meditar
sobre a fé religiosa, como estágio superior da vida espiritual. Ou seja, para
ele, a mais alta paixão humana é a fé. Mas ela é, também, uma paixão plana de
paradoxos.
Friedrich Nietzsche (1844-1900),
por sua vez, opera mais um deslocamento do problema do conhecimento, alterando
o papel da filosofia. Para ele, o conhecimento não passa de interpretação, de
atribuição de sentidos, sem jamais ser explicação da realidade. Ora, o conferir
sentidos é, também, o conferir valores, ou seja, os sentidos são atribuídos a
partir de determinada escala de valores que se quer promover.
Diz Nietzsche: “O que é verdade,
portanto? Um batalhão móvel de metáforas, metonímias, antropomorfismos, enfim, uma
soma de relações humanas, que foram enfatizadas poética e retoricamente, transporta
enfeitada, e que, após longo uso, parecem a um povo sólidas, canônicas e
obrigatórias: as verdades são ilusões, das quais se esqueceu o que são,
metáforas que se tornam gastas e sem força sensível, moedas que perderam sua
efígie e agora só entram em consideração como metal, não mais como moedas”.
A tarefa da filosofia é a de
interpretar a “escrita de camadas sobrepostas das expressões e gestos humanos”.
O trabalho interpretativo volta-se, em primeiro lugar, para o exame do conjunto
de texto metafísico, a fim de desmascarar o modo pelo qual a linguagem passou
do nomear as coisas concretas para o sistematizar verdades eternas.
Como método de decifração,
Nietzsche propõe a genealogia, que coloca em relevo os diferentes processos de instituição
de um texto, mostrando as lacunas, os espaços em branco mais significativo, o
que não foi dito ou foi recalcado e que permitiu erigir determinados conceitos
em verdades absolutas e eternas. Ao empreender o caráter histórico dos
conceitos, bem como dos códigos, esclarecendo sua relação com outros, a
genealogia mostra o que eles excluíram para poder chegar à “intemporalidade” da
tradição, da autoridade ou da lei. Ao expor a inexistência de significados
estáveis, isoláveis, conclui pela ausência de qualquer fundamento rigoroso da
verdade metafísica.
Nietzsche mostra, ainda, as
origens extra racionais da razão. Para ele, o conhecimento é resultado de uma
luta, do compromisso entre instintos. De fato, o destino humano depende da
função que ser der ao instinto, aos quais se subordinam a consciência e a
moral. No entanto, pelo procedimento genealógico, Nietzsche procura adotar um
critério para compreender a avaliação que foi feita desses instintos e descobre
que o único critério que se impõe é a vida.
Também Marx adverte sobre os
ilusões do conhecimento, sobretudo quando descreve os fenômenos da alienação e
da ideologia, pelas quais a “verdades” da classe dominada, impedindo que ela
mesma desenvolva sua própria visão de mundo.
Sigmund Freud (1856-1939),
fundador da psicanálise, desmente as crenças racionalistas de que a consciência
humana é o centro das decisões e do controle dos desejos, ao levantar a
hipótese de inconsciente. Diante das forças conflitantes das pulsões, os
indivíduo reage, mas desconhece as determinantes de sua ação. Caberá ao
processo psicanalítico auxiliá-lo na busca do que foi silenciado pela repressão
dos desejos.
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