Comte
reconhece que a matemática, pela simplicidade de seu objeto, desde a
Antiguidade teria atingido o estado positivo e a considera à parte por ser uma
espécie de instrumento de todas as outras. Ao fazer a classificação das
ciências, portanto, distingue cinco delas: astronomia, física, química,
fisiologia (biologia) e “física social” (sociologia). O critério da
classificação parte da mais simples, mais geral e mais afastada do humano, que é
a astronomia, até a mais complexa e concreta, a sociologia.
Auguste Comte (1798-1857) |
Essa
ordem de classificação não é apenas lógica, mas cronológica, pois as ciências
apareceram no tempo nessa sequência. Também é uma ordem hierárquica de poder,
em que a sociologia aparece como o poder dominante em relação à totalidade do
saber científico. Apesar de ser mais dependente epistemologicamente, ela seria
soberana entre todas, enquanto saber da totalidade da Ordem e do Progresso da
humanidade, no passado, no presente e no futuro. Aliás, o curso de Filosofia
positiva em grande parte foi pensado como ensinamento aos cientistas “destinados
às mais altas funções sociais”.
Comte
se diz fundador da sociologia, por ter sido ele quem lhe deu o nome e o
estatuto de ciência. Define-se como uma física social, mas na verdade toma os
modelos da biologia e explica a sociedade como um organismo coletivo. Entusiasmara-se
pela então recente teoria frenológica de Gall, que analisa a inteligência humana
pela sua origem orgânica, inclusive buscando delimitar as localizações celebrais
dessas faculdades, sem considerar conceitos como “eu”, “alma”, “consciência”, típicos
da filosofia tradicional. Inspirado por essa teoria, Comte afirma que apenas
uma elite teria capacidade de desenvolver a parte frontal do cérebro, sede da
faculdade superior, ou seja, da inteligência e dos sentimentos morais, e conclui
pela necessidade de a maioria dos seres humanos – dominados pela afetividade e,
portanto causadores da desestabilidade social – serem moldados e dirigidos em
nome da harmonia e da ordem social, a fim de garantir o “progresso dentro da
ordem”.
Dessa
forma, reconhece que o individuo submetido à consciência coletiva; tem pouca
possibilidade de intervenção nos fatos sociais. A ordem da sociedade é
permanente, à imagem da invariável ordem natural constantes, como a
propriedade, a família, o trabalho, a pátria, a religião.
Para
alguns interpretes, a filosofia de Comte pode ser considerada como uma reação
conservadora à Revolução Francesa (1789). No entanto, Comte não pensava em uma
volta ao passado, à realeza e ao catolicismo, como forma de conservar a ordem
burguesa abalada pela revolução. Não pretendia eliminar o progresso, mas
desenvolver uma teoria da ordem com o progresso: ele quer participar da
reconstrução, instituindo a ordem de maneira soberana. E é essa ideia de ordem
que domina seu trabalho de sistematização da filosofia, levando-o à necessidade
de classificar as ciências e todo o conhecimento em quadros fechados,
estanques. (Observe que a palavra ordem significa ao mesmo tempo “arranjo” e “mando”).
É o próprio Comte que afirma: “Nenhum grande progresso pode efetivamente se
realizar se não tende finalmente para a evidente consolidação da ordem”.
A
história não é mais pensada como um vir-a-Ser, mas como uma sequência congelada
de estados definitivos, e a evolução nada, mas é do que a realização, no tempo,
daquilo que já existia em forma embrionária e que se desenvolve até alcançar o
seu ponto final. O conceito de ciência
comteano é o de um saber acabado, que se mostra sob a forma de resultados e
receitas. Tendo colocado a ciência positiva como o ápice da vida e do
conhecimento humanos, Comte prossegue estabelecendo uma série de postulados aos
quais a ciência deve se formar. O principal deles é que a ciência deve
assegurar a marcha normal e regular da sociedade industrial. Ora, ao fazer
isso, Comte troca a teoria filosófica do conhecimento por uma ideologia.
Próxima postagem: A religião da Humanidade
Nenhum comentário:
Postar um comentário